Legislação e compromissos políticos internacionais

Índice

Normas específicas sobre prostituição, lenocínio e tráfico para fins de exploração sexual em geral

ONU

Convenção para a Supressão do tráfico de Pessoas e da Exploração da Prostituição de Outrem

Preâmbulo

… a prostituição e o mal que a acompanha, a saber, o tráfico de pessoas com vista à prostituição, são incompatíveis com a dignidade e valor da pessoa humana…;

Artigo 1.º

As Partes na presente Convenção convencionam punir toda a pessoa que, para satisfazer as paixões de outrem:
1) Alicie, atraia ou desvie com vista à prostituição uma outra pessoa, mesmo com o acordo desta;
2) Explore a prostituição de uma outra pessoa, mesmo com o seu consentimento.

Artigo 2.º

As Partes na presente Convenção convencionam igualmente punir toda a pessoa que:
1) Detenha, dirija ou conscientemente financie ou contribua para o financiamento de uma casa de prostituição;
2) Dê ou tome conscientemente em locação, no todo ou em parte, um imóvel ou um outro local com a finalidade de prostituição de outrem.

Artigo 3.º

Na medida do permitido pela legislação nacional, toda a tentativa e todo o ato preparatório praticado com vista a cometer as infrações referidas nos artigos 1.º e 2.º serão igualmente punidos.

Artigo 4.º

Na medida do permitido pela legislação nacional, a participação intencional nos atos referidos nos artigos 1.º e 2.º acima referidos é igualmente punível.
Na medida do permitido pela legislação nacional, os atos de participação serão considerados como infrações distintas em todos os casos em que seja necessário proceder desse modo para impedir a impunidade.

Artigo 6.º

Cada uma das Partes da presente Convenção compromete-se a tomar todas as medidas necessárias para revogar ou abolir toda a lei, regulamento ou prática administrativa segundo os quais as pessoas que se dedicam ou se presume dedicarem-se à prostituição devem inscrever-se em registos especiais, possuir papéis especiais ou ficarem sujeitas a condições excecionais de vigilância ou de notificação.

Artigo 7.º

Toda a condenação anterior proferida num Estado estrangeiro em relação a qualquer dos atos referidos na presente Convenção será, na medida do permitido pela legislação nacional, tomada em consideração:
1) Para estabelecer a reincidência;
2) Para declarar a incapacidade para o exercício de direitos civis.

Artigo 12.º

A presente Convenção não afeta o princípio segundo o qual os atos por ela visados devem, em cada Estado, ser qualificados, julgados e punidos de acordo com a legislação nacional.

Artigo 16.º

As Partes na presente Convenção acordam em tomar ou encorajar, através dos seus serviços sociais, económicos, de ensino, de higiene e outros serviços similares, quer sejam públicos ou privados, medidas destinadas a prevenir a prostituição e a assegurar a reeducação e a reintegração social das vítimas da prostituição e das infrações visadas pela presente Convenção.

Artigo 17.º

As Partes na presente Convenção comprometem-se, no que diz respeito à imigração e emigração, a adotar ou manter em vigor, nos limites das suas obrigações definidas na presente Convenção, medidas destinadas a combater o trafico de pessoas de ambos os sexos com a finalidade da prostituição.
Comprometem-se, nomeadamente:
1) A aprovar os regulamentos necessários para proteção dos imigrantes ou emigrantes, em particular das mulheres e das crianças, tanto nos locais de chegada e partida como durante a viagem;
2) A prover no sentido da organização de uma propaganda apropriada que consciencialize o público dos perigos deste tráfico;
3) A tomar as medidas apropriadas para que seja exercida uma vigilância nas gares, nos aeroportos, nos portos marítimos, durante as viagens e nos locais públicos, com vista a impedir-se o tráfico internacional de pessoas para fins de prostituição;
4) A tomar todas as medidas apropriadas para que as autoridades competentes sejam prevenidas da chegada de pessoas que aparentem manifestamente ser culpadas, cúmplices ou vítimas deste tráfico.

Artigo 18.º

As Partes na presente Convenção comprometem-se a recolher, de acordo com as condições estipuladas pela legislação nacional, declarações de pessoas de nacionalidade estrangeira que se dediquem à prostituição, com vista ao estabelecimento da sua identidade e estado civil e averiguar quem as induziu a deixar o seu Estado. Estas informações serão comunicadas às autoridades do Estado de origem das ditas pessoas, com vista ao seu eventual repatriamento.

Artigo 19.º

As Partes na presente Convenção comprometem-se, de acordo com as condições previstas pela legislação nacional e sem prejuízo da prossecução de qualquer outra Acão intentada em relação às infrações às suas disposições e tanto quanto possível:
1) A tomar as medidas apropriadas para prover as necessidades e assegurar o sustento, a titulo provisório, das vitimas do trafico internacional destinado à prostituição, quando estas não disponham de recursos, enquanto se espera que sejam tomadas as medidas com vista ao seu repatriamento;
2) A repatriar as pessoas referidas no artigo 18.º que o desejem ou que sejam reclamadas por pessoas que sobre elas tenham autoridade ou aquelas cuja expulsão seja decretada de acordo com a lei. O repatriamento não será́ efetuado antes do acordo com o Estado de destino sobre a sua identidade e nacionalidade, bem como sobre o local e a data de chegada à fronteira. Cada uma das Partes na presente Convenção facilitará a passagem das pessoas em questão pelo seu território.
No caso de as pessoas referidas no paragrafo precedente não poderem, elas mesmas, reembolsar os custos do seu repatriamento e quando não tenham nem cônjuge, nem parentes, nem tutor que paguem por elas, os custos de repatriamento ficarão a cargo do Estado onde elas se encontram até à fronteira, porto de embarque ou aeroporto mais próximo na direção do Estado de origem, e a partir daí serão suportadas pelo Estado de origem.

Artigo 20.º

As Partes na presente Convenção comprometem-se, se ainda o não fizeram, a tomar as medidas necessárias para que seja exercida vigilância a nível de agências de emprego, com vista a evitar que pessoas que procuram emprego, particularmente as mulheres e as crianças, fiquem expostas aos perigos da prostituição.

Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, CEDAW e Recomendações

CEDAW
Artigo 6.º

Os Estados Partes tomam todas as medidas apropriadas, incluindo disposições legislativas, para suprimir todas as formas de tráfico das mulheres e de exploração da prostituição das mulheres.

Recomendação Geral CEDAW n.º 19, sobre Violência contra as Mulheres

§ 13. No artigo 6.º (da CEDAW) exige-se aos Estados Partes que adotem medidas para suprimir todas as formas de tráfico e exploração da prostituição das mulheres.
§ 14. A pobreza e o desemprego aumentam as oportunidades de tráfico. Para além das formas estabelecidas, existem novas formas de exploração sexual, como o turismo sexual, a contratação de trabalhadoras domésticas de países em desenvolvimento para países desenvolvidos e o casamento de mulheres de países em desenvolvimento com estrangeiros. Estas práticas são incompatíveis com a igualdade de direitos e com o respeito pelos direitos e a dignidade das mulheres, colocando-as em situações de especial risco de que venham a sofrer violência e maus tratos.
§ 15: A pobreza e o desemprego obrigam muitas mulheres, incluindo raparigas, a prostituir-se. As prostitutas são especialmente vulneráveis à violência, pois a sua condição, que pode ser ilegal, conduz à sua marginalização. Precisam de proteção, em condições de igualdade perante a lei, contra a violação e outras formas de violência.

Recomendação Geral CEDAW n.º 35 sobre violência de género contra as mulheres, atualizando a Recomendação Geral n.º 19[8]

§9. O conceito de “violência contra as mulheres” presente na Recomendação Geral n.º 19 e em outros instrumentos e documentos internacionais têm enfatizado que essa violência é baseada no gênero. Nesse sentido, este documento utiliza a expressão “violência de gênero contra as mulheres”, como um termo mais preciso, que torna explícitas as causas que se baseiam no gênero e os impactos da violência. Esta expressão fortalece ainda mais a compreensão desta violência como um problema social – ao invés de individual – que exige respostas abrangentes, para além de eventos específicos, agressores individuais e vítimas/sobreviventes.
§10. O Comitê considera que a violência de gênero contra as mulheres é um dos meios sociais, políticos e econômicos fundamentais pelos quais a posição subordinada das mulheres em relação aos homens e seus papéis estereotipados são perpetuados. Ao longo de seu trabalho, o Comitê deixou claro que essa violência é um obstáculo crítico para alcançar a igualdade substantiva entre mulheres e homens, assim como para o gozo das mulheres dos direitos humanos e das liberdades fundamentais consagrados na Convenção.
§12. A Recomendação Geral n° 28 sobre a obrigação central dos Estados Partes nos termos do artigo 2° da Convenção, bem como a Recomendação Geral n° 33 sobre o acesso das mulheres à justiça, confirma que a discriminação contra as mulheres é indissociável de outros fatores que afetam as suas vidas. A jurisprudência do Comitê destaca que estes fatores podem incluir etnia/raça, ser indígena ou pertencer a outro grupo minoritário, cor, status socioeconômico e/ou casta, língua, religião ou crença, opinião política, nacionalidade, estado civil e/ou maternal, idade, localização urbana/rural, estado de saúde, deficiência, propriedade, ser lésbica, bissexual, transexual ou intersexual, analfabetismo, tráfico de mulheres, conflito armado, procura de asilo, ser refugiada, deslocamento interno, apatridia, migração, chefia de família, viuvez, conviver com HIV/AIDS, privação de liberdade, estar na prostituição, distanciamento geográfico e estigmatização das mulheres que lutam por seus direitos, incluindo defensoras de direitos humanos. Assim, como as mulheres experimentam formas de discriminação diferentes e interseccionais, que geram um impacto negativo agravante, o Comitê reconhece que a violência de gênero pode afetar algumas mulheres em diferentes graus, ou de maneiras diferentes, então são necessárias respostas legais e políticas adequadas.
§15. O direito das mulheres a uma vida livre de violência de gênero é indivisível e interdependente com relação a outros direitos humanos, incluindo o direito à vida, à saúde, à liberdade e à segurança pessoal, o direito à igualdade e à igual proteção dentro da família, à liberdade contra a tortura, o tratamento cruel, desumano ou degradante e à liberdade de expressão, movimento, participação, reunião e associação.
§19. O Comitê considera que a violência de gênero contra as mulheres está enraizada em fatores relacionados ao gênero, como a ideologia do direito e o privilégio dos homens sobre as mulheres, as normas sociais em relação à masculinidade, a necessidade de afirmar o controle ou poder masculino, reforçar os papéis de gênero ou prevenir, desencorajar ou punir o que é considerado um comportamento inaceitável para as mulheres. Esses fatores também contribuem para a aceitação social explícita ou implícita da violência de gênero contra as mulheres, muitas vezes ainda considerada como uma questão privada, e para a impunidade generalizada quanto a ela.
§34. Adotar e implementar medidas legislativas efetivas e outras medidas preventivas adequadas para enfrentar as causas subjacentes à violência de gênero contra as mulheres, incluindo atitudes e estereótipos patriarcais, desigualdade na família e negligência ou negação de direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais das mulheres, bem como promover o empoderamento, a atuação e a voz das mulheres.
§ 43. Desenvolver e divulgar informações acessíveis voltadas para as mulheres, em particular, aquelas afetadas por formas interseccionais de discriminação, como as com deficiência, analfabetas ou que têm pouco ou nenhum conhecimento das línguas oficiais do país, dos recursos jurídicos e sociais disponíveis para as vítimas/sobreviventes de violência de gênero contra as mulheres, incluindo a reparação, através de uma mídia diversa e acessível e de diálogo comunitário.

Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional, relativo à Prevenção, à Repressão e à Punição do Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças

Art. 3.º – Definições

a) Por “tráfico de pessoas” entende-se o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração. A exploração deverá incluir, pelo menos, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, a escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a extração de órgãos;
b) O consentimento dado pela vítima de tráfico de pessoas tendo em vista qualquer tipo de exploração descrito na alínea a) do presente artigo, deverá ser considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios referidos na alínea a);
c) O recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de uma criança para fins de exploração deverão ser considerados “tráfico de pessoas” mesmo que não envolvam nenhum dos meios referidos na alínea a) do presente artigo;
d) Por “criança” entende-se qualquer pessoa com idade inferior a dezoito anos.

Artigo 4.º – Âmbito de aplicação

Para efeitos do presente Protocolo:
O presente Protocolo aplica-se, salvo disposição em contrário, à prevenção, à investigação e à repressão das infrações estabelecidas em conformidade com o seu artigo 5.º do presente Protocolo, quando essas infrações sejam de natureza transnacional e envolvam um grupo criminoso organizado, bem como à proteção das vítimas dessas infrações.

Art. 9.º – Prevenção do tráfico de pessoas


5 — Os Estados Partes deverão adotar ou reforçar as medidas legislativas ou outras, tais como medidas educativas, sociais ou culturais, designadamente através da cooperação bilateral ou multilateral, a fim de desencorajar a procura que propicie qualquer forma de exploração de pessoas, em especial de mulheres e crianças, que leve ao tráfico.

Conselho da Europa

Convenção do Conselho da Europa Relativa à Luta contra o Tráfico de Seres Humanos

Artigo 1.º – Finalidade da Convenção

1 — A presente Convenção tem por finalidade:
a) Prevenir e lutar contra o tráfico de seres humanos, garantindo a igualdade entre mulheres e homens;
b) Proteger os direitos humanos das vítimas de tráfico, estabelecer um quadro completo de proteção e de assistência às vítimas e às testemunhas garantindo a igualdade entre mulheres e homens, bem como assegurar investigações e procedimentos eficazes;
c) promover a cooperação internacional no domínio da luta contra o tráfico de seres humanos.
2 —…

Artigo 2.º – Âmbito de aplicação

A presente Convenção será́ aplicável a todas as formas de tráfico de seres humanos, de âmbito nacional ou internacional, independentemente da sua ligação ou não ligação à criminalidade organizada.

Artigo 3.º – Princípio da não discriminação
Artigo 4.º – Definições

Para efeitos da presente Convenção:
a) «Tráfico de seres humanos» designa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa com autoridade sobre outra, para fins de exploração. A exploração deverá incluir, pelo menos, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, a escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a extração de órgãos;
b) O consentimento dado pela vítima de «tráfico de seres humanos» à exploração referida na alínea a) do presente artigo será́ considerado irrelevante se tiver sido utilizado qualquer um dos meios indicados na alínea a) do presente artigo;

Artigo 5.º – Prevenção do tráfico de seres humanos

1 — Cada uma das Partes tomará medidas que visem estabelecer ou reforçar a coordenação, a nível nacional, entre as diferentes entidades responsáveis pela prevenção e pela luta contra o tráfico de seres humanos.
2 — Cada uma das Partes criará e ou apoiará políticas e programas eficazes a fim de prevenir o tráfico de seres humanos através de meios como: pesquisas; campanhas de informação, sensibilização e educação; iniciativas sociais e económicas e programas de formação, particularmente dirigidos a pessoas vulneráveis ao tráfico e aos profissionais envolvidos na luta contra o tráfico de seres humanos.
3 — Cada uma das Partes promoverá uma abordagem baseada nos direitos humanos e na igualdade entre mulheres e homens, bem como uma abordagem que respeite as crianças, no desenvolvimento, na implementação e na avaliação do conjunto de políticas e programas referidos no n.º 2.

Artigo 6.º – Medidas para desencorajar a procura

A fim de desencorajar a procura que favorece todas as formas de exploração das pessoas, em particular de mulheres e crianças, conducente ao tráfico, cada uma das Partes adotará́ ou reforçará́ medidas legislativas, administrativas, educativas, sociais, culturais ou outras, incluindo:
a) Pesquisas sobre as melhores práticas, métodos e estratégias;
b) Medidas visando a consciencialização da responsabilidade e do importante papel dos meios de comunicação e da sociedade civil na identificação da procura como uma das causas profundas do tráfico de seres humanos;
c) Campanhas de informação direcionadas, envolvendo, se apropriado, as autoridades públicas e os decisores políticos, entre outros;
d) Medidas preventivas que incluam programas educativos destinados às raparigas e aos rapazes em fase de escolaridade, que sublinhem o carácter inaceitável da discriminação com base no sexo e as suas consequências nefastas, a importância da igualdade entre mulheres e homens, bem como a dignidade e a integridade de cada ser humano.

Capítulo III – Medidas que visam proteger e promover os direitos das vítimas, garantindo a igualdade entre mulheres e homens:

Artigos 10.º a 17.º

Capítulo IV – Direito penal substantivo
Artigos: 18.º a 26.º.

Artigo 35.º – Cooperação com a sociedade civil
Capítulo VII – Mecanismo de acompanhamento
Artigo 36.º – GRETA

União Europeia

Diretiva 2011/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de Abril de 2011, relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à proteção das vítimas, e que substitui a Decisão-Quadro 2002/629/JAI do Conselho

Preâmbulo

(1) O tráfico de seres humanos constitui um crime grave, cometido frequentemente no quadro da criminalidade organizada, e uma violação grosseira dos direitos humanos fundamentais expressamente proibida pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A prevenção e o combate ao tráfico de seres humanos constituem prioridades da UE e dos Estados-Membros.
(3) A presente diretiva reconhece que o tráfico é um fenómeno com aspetos específicos conforme o sexo e que os homens e as mulheres são objeto de tráfico para diferentes fins. Por este motivo, as medidas de assistência e apoio deverão ser diferenciadas por sexo, sempre que oportuno. Os fatores de «dissuasão» e «incentivo» podem ser diferentes conforme os setores em questão, como seja o tráfico de seres humanos na indústria do sexo ou para exploração laboral, por exemplo, na construção civil, na agricultura ou no trabalho doméstico.
(8) As crianças são mais vulneráveis do que os adultos e, por esta razão, existe um maior risco de se tornarem vítimas do tráfico de seres humanos. Na aplicação da presente diretiva, o superior interesse da criança deve constituir a principal consideração, nos termos da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança de 1989.
(12)…
No contexto da presente diretiva, entre as pessoas particularmente vulneráveis devem incluir-se, pelo menos, todas as crianças. Outros fatores que poderão ser tidos em conta na apreciação da vulnerabilidade da vítima incluem, por exemplo, o sexo, a gravidez, o estado de saúde e a deficiência. Caso a infração seja especialmente grave, por exemplo, se puser em perigo a vida da vítima, envolver violência grave, como tortura, uso forçado de drogas/medicamentos, violação ou outras formas graves de violência psicológica, física ou sexual, ou de outro modo tiver causado à vítima danos particularmente graves, tal facto deverá traduzir-se numa sanção agravada.

(25) Os Estados-Membros deverão estabelecer e/ou reforçar as políticas de prevenção do tráfico de seres humanos, incluindo através de medidas de dissuasão e redução da procura que favoreça todas as formas de exploração, e de medidas para reduzir o risco de as pessoas se torna­ rem vítimas do tráfico, através da investigação, nomeadamente da investigação relativa a novas formas de tráfico de seres humanos, informação, sensibilização e educação. No âmbito dessas iniciativas, os Estados-Membros deverão adotar uma perspetiva que tenha em conta as questões de género e os direitos da criança. Os funcionários e agentes suscetíveis de entrar em contacto com vítimas, efetivas ou potenciais, do tráfico de seres humanos, deverão receber formação adequada para identificar e lidar com tais vítimas. Esta obrigação de formação deverá ser promovida para o seguinte pessoal suscetível de vir a estar em contacto com vítimas: agentes da polícia, guardas de fronteira, funcionários dos serviços de imigração, magistrados do ministério público, juristas, magistrados e funcionários judiciais, inspetores do trabalho, pessoal dos serviços sociais, de acolhimento de crianças, de saúde e pessoal consular, podendo também, em função das circunstâncias locais, envolver igualmente outros grupos de funcionários e agentes públicos que sejam suscetíveis de entrar em contacto com vítimas de tráfico no exercício das suas funções.

Artigo 1.º – Objeto

A presente diretiva estabelece as regras mínimas relativas à definição das infrações penais e das sanções no domínio do tráfico de seres humanos. Introduz igualmente disposições comuns, tendo em conta uma perspetiva de género, para reforçar a prevenção destes crimes e a proteção das suas vítimas.

Artigo 2.º – Infrações relativas ao tráfico de seres humanos

1. Os Estados Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que os seguintes atos intencionais são puníveis:
Recrutamento, transporte, transferência, guarida ou acolhimento de pessoas, incluindo a troca ou a transferência do controlo sobre elas exercido, através do recurso a ameaças ou à força ou a outras formas de coação, rapto, fraude, ardil, abuso de autoridade ou de uma posição de vulnerabilidade, ou da oferta ou obtenção de pagamentos ou benefícios a fim de conseguir o consentimento de uma pessoa que tenha controlo sobre outra para efeitos de exploração.
2. Por posição de vulnerabilidade entende-se uma situação em que a pessoa não tem outra alternativa, real ou aceitável, que não seja submeter-se ao abuso em causa.
3. A exploração inclui, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, incluindo a mendicidade, a escravatura ou práticas equiparáveis à escravatura, a servidão, a exploração de atividades criminosas, bem como a remoção de órgãos.
4. O consentimento de uma vítima do tráfico de seres humanos na sua exploração, quer na forma tentada quer consumada, é irrelevante se tiverem sido utilizados quaisquer dos meios indicados no n. 1.
5. Sempre que o comportamento referido no n.º 1 incidir sobre uma criança, deve ser considerado uma infração punível de tráfico de seres humanos, ainda que não tenha sido utilizado nenhum dos meios indicados no n.º 1.
6. Para efeitos da presente diretiva, entende-se por «criança» qualquer pessoa com menos de 18 anos.

Artigo 3.º – Instigação, auxílio e cumplicidade, e tentativa

Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que são puníveis a instigação, o auxílio e a cumplicidade, ou a tentativa de cometer qualquer das infrações referidas no artigo 2.º.

Artigo 5.º – Responsabilidade das pessoas coletivas

1. Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que as pessoas coletivas possam ser consideradas responsáveis pelas infrações referidas nos artigos 2.º e 3.º, cometidas em seu benefício por qualquer pessoa, agindo a título individual ou como membro de um órgão da pessoa coletiva, que nesta ocupe uma posição de liderança, com base:
a) Em poderes de representação da pessoa coletiva;
b) na autoridade para tomar decisões em nome da pessoa coletiva; ou
c) Na autoridade para exercer controlo dentro da pessoa coletiva.
2. Os Estados-Membros devem igualmente garantir que uma pessoa coletiva possa ser responsabilizada sempre que a falta de supervisão ou de controlo por parte de uma pessoa referida no n.º 1 tenha possibilitado a prática de infrações referidas nos artigos 2.º e 3.º, em benefício dessa pessoa coletiva, por uma pessoa sob a sua autoridade.
3. A responsabilidade das pessoas coletivas prevista nos n.ºs 1 e 2 não exclui a instauração de processos penais contra as pessoas singulares que sejam autoras, instigadoras ou cúmplices nas infrações referidas nos artigos 2.º e 3.º.
4. Para efeitos da presente diretiva, entende-se por «pessoa coletiva» qualquer entidade dotada de personalidade jurídica por força do direito aplicável, com exceção do Estado ou de organismos públicos no exercício de prerrogativas de autoridade pública e das organizações internacionais públicas.

Artigo 6.º – Sanções aplicáveis às pessoas coletivas

Os Estados-Membros devem tomar as medidas necessárias para garantir que as pessoas coletivas consideradas responsáveis nos termos dos n.ºs 1 ou 2 do artigo 5.º sejam passíveis de sanções efetivas, proporcionadas e dissuasivas, incluindo multas ou coimas e, eventualmente, outras sanções, tais como:
a) Exclusão do direito a benefícios ou auxílios públicos;
b) Proibição temporária ou permanente de exercer atividade comercial;
c) Colocação sob vigilância judicial;
d) Liquidação judicial;
e) Encerramento temporário ou definitivo dos estabelecimentos utilizados para a prática da infração.

Artigo 18.º – Prevenção

1. Os Estados-Membros devem tomar medidas adequadas, como a educação e a formação, para desencorajar e reduzir a procura que incentiva todas as formas de exploração ligada ao tráfico de seres humanos.
2. Os Estados-Membros devem tomar medidas adequadas, nomeadamente através da Internet, tais como campanhas de informação e sensibilização, programas de investigação e educação, se necessário em cooperação com organizações relevantes da sociedade civil e outras partes interessadas, a fim de aumentar a consciencialização em relação a este problema e de reduzir o risco de pessoas, sobretudo as crianças, virem a ser vítimas de tráfico de seres humanos.
3. Os Estados Membros devem promover uma formação regular dos funcionários e agentes suscetíveis de virem a estar em contacto com vítimas ou potenciais vítimas de tráfico de seres humanos, incluindo os agentes da polícia no terreno, a fim de que estes possam identificar e lidar com as vítimas e potenciais vítimas de tráfico de seres humanos.
4. A fim de tornar a prevenção e a luta contra o tráfico de seres humanos mais eficazes mediante o desencorajamento da procura, os Estados-Membros devem considerar a possibilidade de criminalizar a utilização dos serviços que são objeto de exploração, tal como referida no artigo 2.º, quando o utilizador tenha conhecimento de que a pessoa é vítima de uma infração referida no artigo 2. o.

Legislação Portuguesa

Código Penal

Artigo 11.º – Responsabilidade das pessoas singulares e coletivas

1 – Salvo o disposto no número seguinte e nos casos especialmente previstos na lei, só as pessoas singulares são suscetíveis de responsabilidade criminal.
2 – As pessoas coletivas e entidades equiparadas, com exceção do Estado, de pessoas coletivas no exercício de prerrogativas de poder público e de organizações de direito internacional público, são responsáveis pelos crimes previstos nos artigos 152.º-A e 152.º-B, nos artigos 159.º e 160.º, nos artigos 163.º a 166.º sendo a vítima menor, e nos artigos 168.º, 169.º, 171.º a 176.º, 217.º a 222.º, 240.º, 256.º, 258.º, 262.º a 283.º, 285,º, 299.º, 335.º, 348.º, 353.º, 363.º, 367.º, 368.º-A e 372.º a 376.º, quando cometidos:
a) Em seu nome e no interesse coletivo por pessoas que nelas ocupem uma posição de liderança; ou
b) Por quem aja sob a autoridade das pessoas referidas na alínea anterior em virtude de uma violação dos deveres de vigilância ou controlo que lhes incumbem.

Artigo 160.º – Tráfico de pessoas

1 – Quem oferecer, entregar, recrutar, aliciar, aceitar, transportar, alojar ou acolher pessoa para fins de exploração, incluindo a exploração sexual, a exploração do trabalho, a mendicidade, a escravidão, a extração de órgãos ou a exploração de outras atividades criminosas:
a) Por meio de violência, rapto ou ameaça grave;
b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;
c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação de dependência hierárquica, económica, de trabalho ou familiar;
d) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima; ou
e) Mediante a obtenção do consentimento da pessoa que tem o controlo sobre a vítima;
é punido com pena de prisão de três a dez anos.
2 – A mesma pena é aplicada a quem, por qualquer meio, recrutar, aliciar, transportar, proceder ao alojamento ou acolhimento de menor, ou o entregar, oferecer ou aceitar, para fins de exploração, incluindo a exploração sexual, a exploração do trabalho, a mendicidade, a escravidão, a extração de órgãos, a adoção ou a exploração de outras atividades criminosas.
3 – No caso previsto no número anterior, se o agente utilizar qualquer dos meios previstos nas alíneas do n.º 1 ou actuar profissionalmente ou com intenção lucrativa, é punido com pena de prisão de três a doze anos.
6 – Quem, tendo conhecimento da prática de crime previsto nos n.ºs 1 e 2, utilizar os serviços ou órgãos da vítima é punido com pena de prisão de um a cinco anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
7 – Quem retiver, ocultar, danificar ou destruir documentos de identificação ou de viagem de pessoa vítima de crime previsto nos n.ºs 1 e 2 é punido com pena de prisão até três anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
8 – O consentimento da vítima dos crimes previstos nos números anteriores não exclui em caso algum a ilicitude do facto.

Artigo 169.º – Lenocínio

1 – Quem, profissionalmente ou com intenção lucrativa, fomentar, favorecer ou facilitar o exercício por outra pessoa de prostituição é punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos.
2 – Se o agente cometer o crime previsto no número anterior:
a) Por meio de violência ou ameaça grave;
b) Através de ardil ou manobra fraudulenta;
c) Com abuso de autoridade resultante de uma relação familiar, de tutela ou curatela, ou de dependência hierárquica, económica ou de trabalho; ou
d) Aproveitando-se de incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da vítima;
é punido com pena de prisão de um a oito anos.

Jurisprudência

Ac. Trib. Relação Porto de 11-04-2012: Pratica, como cúmplice, o crime de lenocínio, o agente que transporta as mulheres para o estabelecimento com vista à prática de atos sexuais a troco de dinheiro, recebe dos clientes o dinheiro relativo ao pagamento dos encontros de cariz sexual entre as mulheres e os clientes, auxilia quem explora o estabelecimento.

Ac. TRP de 28-03-2012: VII. A figura do proxeneta é distinta da do rufia ou rufião: o proxeneta é «corretor, negociador, agente, intermediário» ou «profissional intermediário em amores» que fomenta, facilita ou favorece o exercício da prostituição, ao passo que o rufia ou rufião «é aquele que vive à custa de mulheres de má nota». No rufianismo ou rufianaria há apenas o aproveitamento de atividade alheia «sem que previamente o agente tenha desencadeado a situação que a desencadeou, não sendo sequer necessário que a iniciativa parta do agente, pois pode tratar-se de oferecimento espontâneo da prostituta».
VIII – O lenocínio constitui prática de proxeneta, na medida em que a sexualidade remunerada da prostituta é incentivada, orientada e condicionada por quem a quer explorar.
IX – O bem jurídico protegido com a incriminação do Lenocínio é a liberdade sexual individual da prostituta e a sua dignidade pessoal; tais bens, como bens eminentemente pessoais que são, levam a que se verifique um concurso efetivo de crimes sempre que existir uma pluralidade de vítimas.
X – O acrescento sobre bens jurídicos pessoalíssimos aposto pela revisão de 2007 ao art. 30.º do CP (n.º3) introduz um limite negativo à aplicação da figura do crime continuado: não há crime continuado ? existe, portanto, um concurso real de infrações ? quando o agente tiver atacado bens pessoalíssimos de mais de um portador.

Ac. Trib. Relação Coimbra de 10-07-2013: 1. A atual redação do artigo 169.º, n.º 1 do Código, ao delimitar o tipo, recortando-o apenas em função da ação de fomentar, favorecer ou facilitar o exercício da prostituição, com intenção lucrativa, eliminando a exigência da exploração de uma situação de abandono ou de necessidade económica, assim como a referência ? prática de atos sexuais de relevo, não pune a ingerência na formação da vontade de quem se prostitui mas apenas o aproveitamento que alguém faz de uma prática que, apesar de não ser punida criminalmente, não é reconhecida como plenamente lícita.
2. A diferença específica entre o lenocínio simples (artigo 169.º, n.º 1) e o lenocínio agravado (artigo 169.º, n.º 2) radica na natureza do relacionamento entre quem explora e quem se prostituiu, isto é, na existência ou não da corrupção da livre determinação sexual: havendo livre determinação sexual de quem se prostitui, o lenocínio é simples; não havendo essa liberdade, o lenocínio é agravado.
3. Comete um só crime de lenocínio previsto e punido pelo artigo 169.º, n.º 1 do Código Penal quem, na execução da mesma resolução, favorece a prostituição de várias mulheres

Ac. TRP de 8-07-2015: I. O critério de distinção entre o crime de tráfico de pessoas, p. e p. pelo artigo 160.º, n.º 1, d), do Código Penal e o crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo artigo 169.º, n.º 2, d), do mesmo Código liga-se ao grau de instrumentalização (coisificação) da vítima; o tráfico de pessoas aproxima-se do ápice da instrumentalização da pessoa que representa a escravatura e vai para além do que já é próprio da exploração da prostituição, na privação da liberdade e na ofensa á dignidade da pessoa.
II. É caraterística do crime de tráfico de pessoas a prática da chamada debt bondage, em que o trabalho (ou a prestação sexual), na sua totalidade (não numa parcela maior ou menor), serve de forma de pagamento de uma dívida, como se a pessoa servisse de «garantia» desse pagamento, sendo que normalmente o valor dessa dívida é sobrevalorizado.

Ac. Tr. Relação Evora de 20-01-2015: II. A circunstância «especial vulnerabilidade da vítima» (artigo 160.º, n.º 1, al. d), do Código Penal) não pode deixar de ser interpretada no sentido de se estender a todas as situações em que a pessoa visada não tenha outra escolha real nem aceitável senão a de submeter-se ao abuso, conformando-se a ideia de aceitabilidade a um critério de razoabilidade, e ao humanamente aceitável, designadamente em casos de emigração ilegal, podendo a situação de vulnerabilidade verificar-se, menos na aceitação de determinado trabalho, antes durante a execução das tarefas consignadas, designadamente porque decorre da permanência precária ou ilegal num país estrangeiro e culturalmente estranho.

Ac. Tr. Relação Porto de 8-07-2015: I. O critério de distinção entre o crime de tráfico de pessoas, p. e p. pelo artigo 160.º, n.º 1, d), do Código Penal e o crime de lenocínio agravado, p. e p. pelo artigo 169.º, n.º 2, d), do mesmo Código liga-se ao grau de instrumentalização (coisificação) da vítima; o tráfico de pessoas aproxima-se do ápice da instrumentalização da pessoa que representa a escravatura e vai para além do que já é próprio da exploração da prostituição, na privação da liberdade e na ofensa à dignidade da pessoa.
II. É caraterística do crime de tráfico de pessoas a prática da chamada debt bondage, em que o trabalho (ou a prestação sexual), na sua totalidade (não numa parcela maior ou menor), serve de forma de pagamento de uma dívida, como se a pessoa servisse de «garantia» desse pagamento, sendo que normalmente o valor dessa dívida é sobrevalorizado.

Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, na redação da Lei n.º Lei n.º 102/2017, de 28 de agosto, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional e transpõe as Diretivas 2014/36/UE, de 26 de fevereiro, e 2014/66/UE, de 15 de maio de 2014, e 2016/801, de 11 de maio de 2016

SUBSECÇÃO V

Autorização de residência a vítimas de tráfico de pessoas ou de ação de auxílio à imigração ilegal

Artigo 109.º – Autorização de residência

1 – É concedida autorização de residência ao cidadão estrangeiro que seja ou tenha sido vítima de infrações penais ligadas ao tráfico de pessoas ou ao auxílio à imigração ilegal, mesmo que tenha entrado ilegalmente no País ou não preencha as condições de concessão de autorização de residência.
2 – A autorização de residência a que se refere o número anterior é concedida após o termo do prazo de reflexão previsto no artigo 111.º, desde que:
a) Seja necessário prorrogar a permanência do interessado em território nacional, tendo em conta o interesse que a sua presença representa para as investigações e procedimentos judiciais;
b) O interessado mostre vontade clara em colaborar com as autoridades na investigação e repressão do tráfico de pessoas ou do auxílio à imigração ilegal;
c) O interessado tenha rompido as relações que tinha com os presumíveis autores das infrações referidas no número anterior.
3 – A autorização de residência pode ser concedida antes do termo do prazo de reflexão previsto no artigo 111.º, se se entender que o interessado preenche de forma inequívoca o critério previsto na alínea b) do número anterior.
4 – Pode igualmente ser concedida após o termo do prazo de reflexão previsto no artigo 111.º autorização de residência ao cidadão estrangeiro identificado como vítima de tráfico de pessoas, nos termos de legislação especial, com dispensa das condições estabelecidas nas alíneas a) e b) do n.º 2.
5 – A autorização de residência concedida nos termos dos números anteriores é válida por um período de um ano e renovável por iguais períodos, se as condições enumeradas no n.º 2 continuarem a estar preenchidas ou se se mantiver a necessidade de proteção da pessoa identificada como vítima de tráfico de pessoas, nos termos de legislação especial.

Artigo 110.º – Informação às vítimas

Sempre que as autoridades públicas ou as associações que atuem no âmbito da proteção das vítimas de criminalidade considerarem que um cidadão estrangeiro possa estar abrangido pelo disposto no artigo anterior, informam a pessoa em causa da possibilidade de beneficiarem do disposto na presente secção.

Artigo 111.º – Prazo de reflexão

1 – Antes da emissão da autorização de residência prevista no artigo 109.º, o SEF dá à pessoa interessada um prazo de reflexão que lhe permita recuperar e escapar à influência dos autores das infrações em causa.
2 – O prazo de reflexão referido no número anterior tem uma duração mínima de 30 dias e máxima de 60 dias, contados a partir do momento em que as autoridades competentes solicitam a colaboração, do momento em que a pessoa interessada manifesta a sua vontade de colaborar com as autoridades encarregadas da investigação ou do momento em que a pessoa em causa é sinalizada como vítima de tráfico de pessoas nos termos da legislação especial aplicável.
3 – Durante o prazo de reflexão, o interessado tem direito ao tratamento previsto no artigo 112.º, não podendo contra ele ser executada qualquer medida de afastamento.
4 – O prazo de reflexão não confere ao interessado direito de residência ao abrigo do disposto na presente secção.

Artigo 112.º – Direitos da vítima antes da concessão da autorização de residência

1 – Antes da concessão de autorização de residência, é assegurada à pessoa sinalizada ou identificada como vítima de tráfico de pessoas ou de ação de auxílio à imigração ilegal, que não disponha de recursos suficientes, a sua subsistência e o acesso a tratamento médico urgente e adequado.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior são tidas em consideração as necessidades específicas das pessoas mais vulneráveis, incluindo o recurso, se necessário, a assistência psicológica.
3 – É igualmente garantida a segurança e proteção da pessoa referida no n.º 1.
4 – Sempre que necessário, é prestada à pessoa referida no n.º 1 assistência de tradução e interpretação, bem como proteção jurídica nos termos da Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, não sendo aplicável o disposto no n.º 2 do seu artigo 7.º

Artigo 113.º – Direitos do titular de autorização de residência

1 – Ao titular de autorização de residência concedida nos termos do artigo 109.º que não disponha de recursos suficientes é aplicável, com as devidas adaptações, o disposto no artigo anterior.
2 – Aos titulares de autorização de residência concedida nos termos do artigo 109.º que não disponham de recursos suficientes e tenham necessidades específicas, tais como menores ou mulheres grávidas, deficientes, vítimas de violência sexual ou de outras formas de violência, é prestada a necessária assistência médica e social.
3 – É proporcionado ao titular de autorização de residência concedida nos termos do artigo 109.º o acesso a programas oficiais existentes, cujo objetivo seja ajudá-lo a retomar uma vida social normal, incluindo cursos destinados a melhorar as suas aptidões profissionais ou a preparar o seu regresso assistido ao país de origem.

Artigo 114.º – Menores

1 – Na aplicação do disposto nos artigos 109.º a 112.º é tido em consideração o interesse superior da criança, devendo os procedimentos ser adequados à sua idade e maturidade.
2 – O prazo de reflexão previsto no n.º 2 do artigo 111.º pode ser prorrogado se o interesse da criança o exigir.
3 – Os menores vítimas de tráfico de pessoas ou de ação de auxílio à imigração ilegal têm acesso ao sistema educativo nas mesmas condições que os cidadãos nacionais.
4 – São feitas todas as diligências para estabelecer a identidade e nacionalidade do menor não acompanhado, tal como definido no n.º 5 do artigo 99.º, bem como para localizar o mais rapidamente possível a sua família e para garantir a sua representação legal, incluindo, se necessário, no âmbito do processo penal, nos termos da lei.

Artigo 115.º – Cancelamento da autorização de residência

1 – Sem prejuízo do disposto no artigo 85.º, a autorização de residência concedida ao abrigo da presente secção pode ser cancelada a todo o tempo se:
a) O portador tiver reatado ativa e voluntariamente, por sua própria iniciativa, contactos com os presumíveis autores de tráfico de pessoas ou de auxílio à imigração ilegal; ou
b) A autoridade responsável considerar que a cooperação é fraudulenta ou que a queixa da vítima é infundada ou fraudulenta; ou
c) A vítima deixar de cooperar.
2 – A alínea c) do número anterior não é aplicável aos titulares de autorização de residência concedida ao abrigo do n.º 4 do artigo 109.º.

SECÇÃO VII

Autorização de residência em situações especiais

Artigo 122.º

Autorização de residência com dispensa de visto de residência
1 – Não carecem de visto para obtenção de autorização de residência temporária os nacionais de Estados terceiros:
o) Que tenham beneficiado de autorização de residência concedida ao abrigo do artigo 109.º;
2 – Nos casos previstos nas alíneas o), p) e q) do número anterior é aplicável, com a devida adaptação, o disposto nos artigos 88.º, 89.º ou 90.º, consoante os casos.
6 – Os titulares de autorização de residência concedida com dispensa de visto ao abrigo dos números anteriores gozam dos direitos previstos no artigo 83.º

Decreto Regulamentar n.º 9/2018, de 11 de setembro, que altera a regulamentação do regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território nacional

Artigo 61.º – Pedido de concessão de autorização de residência com dispensa de visto de residência

17 – O pedido de autorização de residência nos termos da alínea o) do n.º 1 do artigo 122.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual, é ainda acompanhado de comprovativo da conclusão do plano de estudos ao nível secundário ou do 1.º ciclo do ensino superior, e de contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho, de contrato de prestação de serviços ou de declaração de início de atividade independente emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).