Dália Rodrigues trabalha n’O Ninho desde 1995. Começou por fazer um estágio curricular no âmbito da Licenciatura em Serviço Social, do qual resultou a monografia “As Boas Práticas da Intervenção Social na Associação O Ninho”. Trabalhou na associação com mulheres em fase de pré-reinserção social, e também com mulheres já inseridas, mas que continuam a ser acompanhadas pela instituição, no denominado “serviço de seguida”.
Coordenou a equipa do Centro Atendimento de o Ninho e de Intervenção em Meio Prostitucional, realizou acompanhamento psicossocial de mulheres em situação de prostituição e dos seus agregados familiares no Centro de Atendimento e realizou estudos e avaliações sociais de situações de mulheres que pedem apoio para a construção de um projeto de vida alternativo à prostituição. Participou em ações de formação, seminários, conferências nacionais e internacionais em várias áreas que enriquecem e possibilitam uma intervenção mais adequada com mulheres prostituídas e vítimas de tráfico para fins de exploração sexual.
Realizou também ações de sensibilização no âmbito do Projeto “Construir Pontes, Desconstruir Preconceitos” na região centro, do Programa POISE. É agora Diretora técnica das várias valências de O Ninho (Centro de Atendimento, Oficinas, Lar e Centro Ocupacional Integrado) desde Junho de 2017.
Comunicação na sessão Fazendo a mudança
O Ninho considera a prostituição como um grave problema social, e como tal devemos trabalhar para combater as causas e consequências da Prostituição e para encontrar alternativas de saída e apoio para estas mulheres.
A prostituição é indissociável das desigualdades sociais, nomeadamente entre homens e mulheres, ricos e pobres e tem um impacto muito negativo no papel e estatuto das mulheres na sociedade.
É indissociável da pobreza, da exclusão social, do desemprego e do trabalho precário.
A prostituição espelha as desigualdades sociais e de género numa sociedade. São sobretudo os mais vulneráveis os primeiros a serem vítimas desta forma de exploração.
E infelizmente os mais vulneráveis continuam a ser as crianças e as mulheres.
A prostituição não tem nada a ver com sexo ou com trabalho e sim com exploração sexual e económica.
O Ninho defende e luta há mais de 50 anos por reais e concretos programas sociais de apoio a jovens e mulheres em situação de prostituição, no sentido da sua promoção humana e social.
Sendo as causas que já referimos o que “empurra” crianças, jovens e mulheres para a prostituição, consideramos que os poderes políticos têm a obrigação social de apoiarem programas de saída para estas pessoas.
Estes programas devem passar por um maior e melhor apoio às associações que trabalham na reinserção social destas jovens e mulheres.
O Ninho considera que o trabalho é o primeiro passo para a reinserção social e para a integração plena na sociedade. Assim seria importante a criação de políticas sociais e de emprego adequadas e integradas numa extensa rede de apoios que passam pelo acesso à saúde, habitação, ao apoio jurídico, aos apoios sociais.
E por ser, infelizmente a norma, estas jovens e mulheres sofrerem de profundos traumas psicológicos e emocionais, estes programas devem ter em conta o tempo que cada uma delas necessita para se sentirem plenamente integradas.
Porque é isso que as mulheres nos pedem, apoio para saírem de uma situação de extrema violência em que a intervenção social deve ser vista sempre numa perspetiva holística e multidisciplinar.
Até 1962, em Portugal vigorou o Modelo Regulamentarista, em que os seus ideólogos se inspiraram em questões moralistas e de proteção da saúde e segurança pública. Este regime envolvia dispositivos de controlo, que incluíam o controlo pessoal (as mulheres eram denominadas de “toleradas” ou “matriculadas” e tinham um cartão de identificação próprio), local (confinamento em estabelecimentos ou bairros específicos), sanitário (para prevenir ou combater doenças de transmissão sexual era obrigatório a ida periódica à inspeção médica) e policial. O ónus da “culpa” criminal e social caía sempre na mulher. Ao cliente não era aplicada nenhuma medida punitiva e socialmente tolerado.
Este período foi marcado quer pela proliferação da sífilis (a grande ameaça à saúde publica desses tempos) quer pelo aumento de bordéis. Por cada bordel devidamente registado, existiam 5 ilegais.
Segue-se o período histórico marcado por um regime ditatorial, em que a defesa da família, da raça e dos bons costumes leva a uma alteração do sistema jurídico da prostituição.
Entra em vigor o Modelo proibicionista, em 1962, e é neste regime, que nasce O Ninho, em 1967.
Com este modelo, que vai prevalecer até 1982, a prostituição era considerada crime e as penas para as mulheres prostituídas podiam ir de 6 meses a 3 anos de prisão efetiva.
É nesse contexto jurídico e social que O Ninho é criado. A então Diretora dos Serviços Prisionais constata que as mulheres condenadas pelo crime de prática de prostituição quase sempre reincidiam e voltavam a ser detidas e condenadas pelo mesmo crime. Concluiu então que essa situação ocorria pois ao cumprirem pena de prisão as mulheres não encontravam qualquer alternativa à prática da prostituição e que era urgente criar-se uma estrutura de apoio para aquando da saída destas mulheres da prisão.
Com a entrada em vigor do Código Penal de 1982, em que o Ninho contribuiu com um parecer, a prostituição é despenalizada e penalizado o lenocínio, a exploração sexual de outrem.
O denominado modelo abolicionista que vigora até hoje é sem dúvida aquele que O Ninho considera o mais eficaz e o mais justo.
É aquele que considerando a prostituição como um sistema organizado, estritamente ligado a outras atividades ilícitas, penaliza aqueles que exploram o elo mais vulnerável deste sistema, as pessoas prostituídas.
Por razões óbvias e já indicadas anteriormente, e conhecendo a história e evolução dos vários sistemas jurídicos que vigoraram em Portugal até hoje, quer o modelo Regulamentarista, tristemente semelhante aos modelos “vanguardistas” que nos querem apresentar hoje em dia, como defensores das pessoas prostituídas, quer o Proibicionista, que delegam ainda mais para a marginalidade e exclusão social, não ajudam a combater esta forma de violência que é a prostituição.
Por outro lado, e tendo em conta que a prostituição funciona como um mercado, em que a oferta se adapta à procura, pensamos que seria essencial que para além da penalização do lenocínio, fosse também penalizado o cliente, pelo que o Modelo Nórdico, deveria ser pensado e adaptado para a realidade portuguesa.